dimanche 29 juillet 2007

Saudade

" Em alguma outra vida, devemos ter feito algo de
muito grave, para sentirmos tanta saudade..."

Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o queixo
no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um pontapé,
doem.Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua,
dói cólica, cárie e pedra no rim.

Mas o que mais dói é a saudade. Saudade de uma irmã que mora longe.
Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais.
Saudade do pai que morreu, do amigo imaginário que nunca existiu.
Saudade de uma cidade.
Saudade da gente mesmo, que o tempo não perdoa.

Doem essas saudades todas.
Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
Saudade da pele, do cheiro, dos beijos.

Saudade da presença, e até da ausência consentida.
Você podia ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá.
Você podia ir para o dentista e ele para a faculdade, mas sabiam-se onde.

Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-lo, mas sabiam-se amanhã.

Contudo, quando o amor de um acaba, ou torna-se menor, ao outro sobra uma
saudade que ninguém sabe como deter. Saudade é basicamente não saber.
Não saber mais se ele continua fungando num ambiente mais frio.

Não saber se ele continua sem fazer a barba por causa
daquela alergia.
Não saber se ele ainda usa aquela camiseta velha.

Não saber se ele foi na consulta com o dermatologista como prometeu.

Não saber se ele tem comido bem por causa daquela
mania de estar sempre ocupado,
se ele aprendeu a estacionar entre dois carros, se ele continua
preferindo Malzebier, se ele ainda lembra de voce quando toma cha gelado,
se ele continua sorrindo

com aqueles olhinhos apertados, se ele continua dançando
daquele jeitinho enlouquecedor, se ele continua escrevendo cartoes, se ele continua detestando o MC Donald's,
se ele continua amando, se ele continua a gostar dos mesmos filmes. Se ele chorou naquele filme novo que te fez chorar...

Saudade é não saber mesmo! Não saber o que fazer com os dias
que ficaram mais compridos, não saber como encontrar
tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como
frear as lágrimas diante de uma música, não saber como
vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber se ele está com outro,
e ao mesmo tempo querer.

É não saber se ele está feliz, e ao mesmo tempo perguntar a
todos os amigos por isso... É não querer saber se ele está
mais magro, se ele esta mais bonito. Saudade é nunca mais
saber de quem se ama, e ainda assim doer.

Saudade é isso que senti enquanto
estive escrevendo e o que você, provavelmente, está
sentindo agora depois que acabou de ler...


extracts from Saudade - Miguel Falabella

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